quarta-feira, maio 07, 2003

Jornalismo Desafiado por Novo Formato



Texto publicado no jornal português Público
Sobre blogs e sua relação com o jornalismo

Tanto o formato "weblog" como o uso que dele é feito tornam importante a questão da sua relação com o jornalismo, e permitem admitir que possa vir a ter algum impacto na forma como o jornalismo é visto pela sociedade. "Para mim, o desafio mais sério que as redacções enfrentam hoje em dia é os leitores pensarem que somos muito irrelevantes para as suas vidas. Isso deve-se em parte ao facto de as redacções não terem transparência nem, pior, interactividade", afirmou Joseph D. Lasica num debate na Escola de Jornalismo da Universidade da Califórnia em Berkeley, transcrito pela "Online Journalism Review". "Os 'weblogs' são uma grande oportunidade para as redacções se tornarem mais transparentes, mais acessíveis", diz também Lasica, um jornalista muito ligado às publicações "on-line" e um entusiasta dos "blogs".

Joseph D. Lasica fazia também eco das preocupações de quem perguntava aos jornalistas "bloggers" como podem ser capazes de publicar uma informação que não confirmaram, ao que ele responde: "Faço o mesmo que todos os 'bloggers', e penso que não há mal em passar dicas ou rumores, desde que fique claro o que é que sei ser verdade, aquilo de que não tenho a certeza e aquilo que ouvi de outros utilizadores. É mais um diálogo ou uma conversa do que um registo oficial."

Rebecca Blood, uma "blogger" veterana, autora de "The Weblog Handbook" (ed. Perseus), é peremptória em recusar que "os comentários pessoais que se encontram na maioria dos 'weblogs' sejam jornalismo". Qual poderá então ser o valor acrescentado dos "weblogs" para o jornalismo? Dan Gillmor, colunista de negócios do "San José Mercury News", considera "espantoso" o "processo de as pessoas se estarem a envolver na criação de informação que é valiosa e frequentemente rigorosa".

"Jornalistas que mantêm "weblogs" em 'sites' de notícias dizem que a sua escrita nos 'blogs' tende a ser mais solta", escrevia por outro lado David F. Gaallagher em Setembro no "New York Times". No mesmo artigo, dizia-se que "os 'blogs' foram promovidos por alguns comentadores como uma ameaça potencial às empresas tradicionais de comunicação social". "Jornalistas amadores são capazes de criar 'links' e dissecar artigos recém-publicados, acrescentando muitas vozes ao debate nacional."

Mas já houve pelo menos um jornalista que se meteu em problemas por "blogar". Steve Olafson, do "Houston Chronicle", manteve um "weblog" utilizando um pseudónimo e foi despedido quando a sua identidade foi conhecida pela empresa. "O sr. Olafson disse que (...) o seu patrão lhe disse que ele comprometera a sua capacidade para fazer o seu trabalho", conta o "NYT". Olafson usava por vezes o seu "site" para ridicularizar políticos locais que cobria, e chegou a criticar o "Houston Chronicle".

"Se o Google introduzisse um instrumento de busca mais eficaz [no Blogger.com], seria mais fácil encontrar os melhores 'bloggers', o que os ajudaria a emergir como definidores de tendências e a moldar a opinião pública - papéis tradicionalmente cumpridos pela comunicação social de massas", escreveu Michael Liedtke na Associated Press. "Darwinismo de conteúdos" é a expressão de Chris Cleveland (gestor de uma empresa de Chicago produtora "software" de busca que recentemente trabalhou com a Blogger.com) para classificar um possível processo que puxaria as notícias e as perspectivas mais interessantes para o primeiro plano do "blogging".

Há também visões menos animadoras do que pode ser o futuro do "blogging". Nesse cenário, o resultado seria uma espécie de cruzamento entre a TV-realidade e um leilão "on-line". "Isto é a e-Bayzação dos 'media'", diz Tony Perkins, ex-editor de uma revista de tecnologia que lançou um negócio através de um "blog", também citado pela AP. "Cria-se uma arena interessante e depois deixa-se o entretenimento vir dos próprios participantes."